quarta-feira, 1 de maio de 2013

A CONCEPÇÃO DE GOVERNAR E DE PODER DE JESUS


  
    Um dos últimos temas tratados por Jesus foi sobre o modo de governar e de poder entre as pessoas. A proposta virtuosa de poder de Jesus foi elaborada em torno de uma mesa durante a celebração da Ceia do Senhor. A ênfase simbólica foi fotografada: em torno da mesa e do gesto da partilha. No instituição da Ceia, surgiu uma discussão entre os apóstolos: qual deles seria o maior.  Jesus, percebendo a competição narcisista entre os seus companheiros.
    Entre eles houve também uma discussão sobre qual deles deveria ser considerado o maior. Jesus, porém disse: “os reis das nações têm poder sobre elas, e os que sobre elas exercem autoridade são chamados benfeitores. Mas entre vocês não deverá ser assim. Pelo contrário, o maior entre vocês seja como o mais novo; e quem governa, seja como aquele que serve. Afinal, quem é o maior: aquele que está sentado à mesa, ou aquele que está servindo? Não é aquele que está sentado à mesa? Eu, porém estou no meio de vocês como quem está servindo” Lc 22.24-30.
    A leitura desse texto ilustra e esclarece o sentido do inconsciente e a estrutura edípica que habita entre nós. A dissonância entre o gesto amoroso de Jesus e as fantasias ambiciosas de poder dos apóstolos é flagrante. Na véspera de sua morte, Jesus cria um dispositivo autogestivo em torno de uma mesa, servindo pão e vinho a cada um de seus convidados.
    Jesus denuncia a forma de governar dos reis. Salienta que os reis preferem a egofilia o gostar de si mesmos; por isso os reis são solitários. Os solitários não amam, ausentam-se, defendem-se, fecham-se e recusam-se à participação ao trabalho de equipe e à autonomia dos companheiros.  Mostra que é possível um grupo autogestionar-se, que é mais saudável os participantes interagirem e amarem sem a presença de um grande líder.  Jesus rompe com a ideia da centralidade do mito, do poder narcisista fálico e do excessivo mais gozar solitário.
    Jesus sinaliza a autonomia e propõe o amor interpessoal e grupal. Inaugura uma relação que abomina a dependência e a possessão em torno do chefe que amplia, o abismo de insaciáveis carências.
    Jesus propõe um corte nas fixações neuróticas afetivas em torno do pai, que produzem disputa avarenta e obscena, delação do traidor, insídia, adulação regressiva infantil.
    O paradigma de governar de Jesus de Nazaré desconstrói a forma de governo onde o bispo, o pastor, o superior, o provincial ou superiora, o líder do conselho tem a última palavra. Jesus amplia a paixão e o amor entre todos. Não à monomania da paixão, sim à polissemia da união entre os/as irmãos/ãs.  A festa da última ceia conseguiu aglutinar as três virtudes: agapé, philia e eros, ou seja, a felicidade e alegria, o amor e o prazer.
    Lamentavelmente, os apóstolos, embriagados e fixados no excesso do puro gozo, não souberam desfrutar desse convívio. Sem dúvida, aquele que bebe sozinho se fecha. Aquele que está voltado apenas para dentro de si teme sair da realidade sensível com os outros. Os discípulos não substituíram o puro gozo do narcisismo fálico pelo prazer afetivo da convivência fraterna.
    Temos que nos perguntar, ainda, se as transformações na composição da vida da igreja como desencanto, sofrimento físico e psíquico, perda de prestígio, aburguesamento, crise de redução de vocações, sentimento de inutilidade, menor valia, desamparo, isolamento, ausência de mística e profetismo, e outros mais São sintomas do que se pode detectar como uma crise ética na sociedade contemporânea?
    Acredito que a Igreja que está em crise é justamente a organização institucional que desacelerou a sua forma de utopia e sonho. É o modelo no qual germinaram as modalidades individualistas, incomunicáveis, centralizadoras, as restrições afetivas impostas, sobre tudo às mulheres, a claustrofobia doméstica em torno de igrejas fechadas, que contribui para fixar as pessoas sem perspectiva política/profética e sem a ternura amiga.
    A rivalidade fratricida que aparece, recorrentemente, entre pastores, religiosos/as e leigos é muito mais a forma de organização em torno de uma figura monárquica vertical e onipotente do que a simples constituição do ser humano.
    Na sociedade vêm surgindo novas formas de poder. Menos centradas na função paterna ou materna. Observam-se novas formas de pacto e a1ianças entre os irmãos/ãs. Hoje tem sido revalorizado, na sociedade civil, o poder da fratria, do trabalho de equipe mais condizente com a vida dos primeiros religiosos mendicantes. A Igreja mudou? A amizade entre os/as irmãos/ãs, aquilo que era mais precioso, perdeu a força?
    Se lutarmos, pastores, presbíteros, diáconos, auxiliares, liderança e leigos para fazer avançar a Igreja, ainda é preciso saber pelo que lutamos. Penso que não vale a pena lutar para manter e conservar a transmissão de leis, normas, estatutos e constituições ou os mesmos e velhos “caminhos que levam a Roma”. E se a luta for por uma Igreja em invenção e criação de poder?  Por ela eu diria que sim, porque pode tornar, voltar a ser, apaixonante, cheia de graça e relevante socialmente, desde que cultivemos novos territórios extraídos de sonhos, de utopias ativas do Mestre Fundador.
Pr. Marcelo da Costa
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